Em coletiva nesta terça-feira (21), o delegado Reginaldo Salomão, titular do Garras, apresentou o equipamento apreendido com suspeitos de tentar furtar uma joalheria em um shopping de Campo Grande. É um módulo eletrônico capaz de captar, analisar e reproduzir sinais de controles remotos que operam em faixas específicas.
Segundo a polícia, o aparelho foi usado para clonar a frequência da trava eletrônica da porta lateral de uma loja, permitindo a entrada dos autores. “Com os bandidos, foi encontrado um equipamento usado para clonagem e abertura da porta para adentrar o shopping”, explicou ao mostrar o decodificador apreendido.
O aparelho apresentado pelo delegado é um módulo de captura e reprodução de sinais de controle remoto, ferramenta útil para engenheiros, mas facilmente comprável e explorada por criminosos para clonar travas eletrônicas de portas, portões e, em alguns casos, sistemas veiculares.
Três homens, de 20, 23 e 26 anos, foram detidos. O jovem de 20 anos foi encontrado escondido na caixa d’água do shopping; outro tinha o aparelho em posse e já era apontado pela polícia como responsável pelo equipamento. A investigação aponta ainda participação do grupo em furtos em outros estados.
A polícia investiga se o grupo já havia agido na mesma joalheria em anos anteriores e apura tentativas semelhantes em outros municípios do estado. Os presos também são suspeitos de crimes em outros estados (furtos no Rio de Janeiro e lesões em Sergipe/Aracaju), segundo informou o Garras.

O que é o aparelho e como funciona
Especialistas descrevem o equipamento como um analisador/decodificador de sinais de controle remoto. Sua função técnica é de captar sinais de controles remotos em faixas como 433 MHz. Para isso, ‘varre’ frequências próximas e gravar o pulso/transmissão enviada por um controle legítimo.
O aparelho é capaz de decodificar o protocolo e reproduzir o mesmo comando posteriormente, reproduzindo o chamado replay ou clonagem. Este é um módulo amplamente usado em eletrônica, automação e engenharia para testes, desenvolvimento e diagnóstico, mas que em mãos erradas vira instrumento para crime.
O engenheiro eletricista e docente Fernando Antônio Camargo Guimarães (IFMS), ouvido pela reportagem, explicou que o aparelho tem uso legítimo, mas também tem sido usado para fins ilegais, como foi o caso do furto ao shopping.
“Esse tipo de aparelho é amplamente comercializado, principalmente em sites de e-commerce, mas deve ser usado em aplicações profissionais, como testes técnicos ou desenvolvimento de sistemas de automação”, explicou.

Quanto custa e quem usa
Conforme levantamentos feitos pela reportagem, esses módulos podem ser adquiridos em e-commerces e marketplaces internacionais por valores a partir de R$ 200 a R$ 400, especialmente em ofertas vindas de sites chineses.
O público-alvo são profissionais que fazem uso legítimo do equipamento, o que inclui engenheiros eletricistas, técnicos em automação e desenvolvedores de sistemas de segurança para testes e desenvolvimento.
O dispositivo apresentado pelo delegado possui usos legítimos e profissionais, como testes de dispositivos eletrônicos, engenharia reversa para compatibilidade, desenvolvimento de controles universais e reposição autorizada de controles perdidos.
No entanto, em mãos de criminosos, ele pode ser usado para clonar sinais de controle remoto, realizar replay de comandos, interferir no travamento de portas (jamming) ou amplificar sinais para abrir sistemas keyless, expondo vulnerabilidades de portões, veículos e travas eletrônicas.
Serve para abrir carros também?
Sim. O equipamento é eficaz contra qualquer controle remoto que opere em faixas de RF (ex.: 433 MHz) e que utilize protocolos vulneráveis, especialmente códigos fixos.
Por isso, além de portões e travas eletrônicas de lojas, pode ser usado para interceptar sinais de alarmes, controles de garagens e, dependendo do sistema do veículo, até para facilitar abertura de carros, sobretudo quando o sistema do veículo não implementa proteções adequadas (rolling code, autenticação forte, etc.).
“O problema é que qualquer pessoa tem acesso a ele. Se alguém estiver próximo de um veículo ou portão no momento do acionamento, pode copiar o sinal do controle remoto e utilizá-lo depois. Infelizmente, é muito difícil se precaver, e a cada dia a distância necessária para clonar o sinal tem aumentado”, alertou o professor Guimarães.
Como se prevenir?
Um profissional em Campo Grande que trabalha com sistemas de segurança afirmou à reportagem do Jornal Midiamax que quanto mais antigo o sistema, mais passível de cópias estaria. “Muitos portões de comércio usam código fixo, depende do controle. Se alguém tiver um desses aparelhos e ficar esperando a loja fechar, quando o dono apertar o controle o freqüencímetro pega a frequência e o código. A pessoa compra um controle igual, põe a mesma numeração e abre a porta depois”, explicou.
Segundo ele, sistemas mais modernos, que se utilizam de codificação digital, estão mais seguros. “Só que tem os sistemas digitais modernos onde não dá para copiar assim. Tem modelos que você precisa ter o controle na mão pra transferir, e outros que têm código fechado: nesses casos a gente tem que programar direto na placa do portão, receber o sinal na plaquinha; não copia só captando o ar. Então, resumindo: pra controles antigos e numeração fixa funciona; pra digitais não dá”, disse ainda.
Assim, para se proteger, é recomendado atualizar os sistemas para controles e receptores com rolling code ou criptografia, inspecionar fisicamente portas e veículos após o travamento, e reprogramar receptores em caso de suspeita de clonagem.
Além disso, é importante monitorar sinais suspeitos, como atrasos no acionamento ou pessoas próximas no momento do uso do controle, e combinar travas físicas com sistemas eletrônicos e sensores adicionais, reforçando a segurança contra usos ilícitos do dispositivo.